sábado, 29 de agosto de 2009

Minha terra agora é aqui, mas antes era lá...


Sentimento de uma imigrante:
Ainda nao sei bem por que estou aqui.
Toda aquela conversa, qualidade de vida, saúde pública, educaçao, tudo isso continua na cabeça, mas nao é o suficiente para me contentar.
Antes, eu idealizava as conversas com as pessoas daqui, agora as realizo querendo falar da terra de lá.
As pessoas daqui sao como as de lá, tem gente boa, gente que gosta de ouvir, gente que gosta de falar, tem até gente para roubar bicicleta,
e toda essa gente faz sentir-me em casa... claro, estou no meu planeta, no Planeta Terra!
Às vezes, penso que devia estar lá...
Às vezes, tenho certeza que tenho mesmo que ficar aqui!
E nessa confusao de sentimentos, um pensamento destaca sobre os outros:
Precisamos sempre saber de onde viemos, para saber para onde vamos, nao é por acaso que o Québec carrega o "Je me souviens".
Por isso escrevo, para registrar o amor que sinto pela minha terra,
lá!
Onde quando pequena chorava para dormir na casa da minha madrinha,
onde aos 7 anos de idade ficava com minha mae e meu pai até às 3 da madrugada, na mesa de um bar, bebendo picolino, enquanto os adultos bebiam cerveja... cantando "vou de táxi" da Angélica e "Como nossos pais" do Belchior, achando lindo todo mundo dizer "nossa Vanusa seu pai toca bem!" e respondendo "cantora" quando os outros me perguntavam "o que você vai ser quando crescer?".
Onde ficava jogando escopa de 7 com meu "vô" Bené quando a luz ia embora, sob a luz de velas, e brincando de "mulher de branco" com a Keyla, a Andressa, a Michele, com todas as crianças da rua, na rua da FAIDEC escura.
Essas sao lembranças bem antigas, mas tem outras mais recentes, lembranças de momentos e de pessoas que foram traçando meu caminho e me conduzindo ao que sou hoje e ao lugar onde estou hoje.
Lembro-me, por exemplo, de quando beijei o Rodrigo pela primeira vez, que foi meu primeiro beijo, aos 10 anos, e de quando o beijei pela segunda vez, aos 15 anos.
Na época, só um beijo, nao sabia nem pensava se ia durar... hoje estamos aqui, longe dos amigos e família, mas juntos, com nosso maravilhoso filho, no Canadá... quem diria? Uma menina da roça, de uma cidadezinha de 8000 habitantes, viajar para um lugar tao longe!
Retomando, nao sei por que estou aqui, se tinha tudo que precisava e gostava lá...
... lá é lindo, o céu é mais azul, como disse "Gonçalves Dias", na sua "Cançao do Exílio"


"Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar — sozinho, à noite —
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá."


Contudo, isso nao é um pensamento de nostalgia, de arrependimento de ter vindo para cá,
isto é um agradecimento à minha terra, às minha raízes!
Graças a estas estou hoje aqui, na minha nova terra, descobrindo que a nossa terra é onde o coraçao quer falar, onde as pessoas te estendem a mao, onde sentimos a presença do Grande Espírito!
Aqui e acolá, jamais esquecerei minha identidade.
Sou o que sou, e a cada dia vou sendo mais, pois tudo aquilo que vou aprendendo, bem como todos aqueles que vou conhecendo, tudo vai se somando a mim, e tudo vai modificando um pouco o meu ser... a tudo isto sou muito grata!
Sei que agora minha terra também é aqui, pois gosto de estar aqui, gosto das pessoas daqui...
Gosto de estar aqui porque, quando estava lá, aprendi a gostar... gostar da natureza, dos pássaros, do céu, da música, de falar, de ouvir, de dançar, de cozinhar, de amar!
Obrigada mae, obrigado pai, obrigada avós, obrigado avôs, madrinha Iraci, padrinho Chiquinho, padrinho Geraldo, obrigado aos mais que amigos, quase pais, Ilmar e Celeste! Obrigado a todos os primos e primas, tios e tias, e a todos os amigos e amigas de Dores de Campos, de Belo Horizonte, em especial Cristina e Franklin, a todos os amigos de Minas Gerais, do Brasil! Obrigado às minhas raízes por terem me dado os pilares que me sustentariam aqui!
Obrigado Rodrigo e Diego, por fazerem parte destes pilares!
Como disse, nao sei bem ainda o que me chamou para cá, e isso nao me incomoda, o nao saber, o importante é saber que, onde estou, tenho um pouco de cada um em mim... posso ser feliz, posso fazer o outro feliz, basta acreditar e se lembrar!

Enfim,
Minha terra agora é aqui,
mas antes era lá.
Um dia pode ser outra vez lá,
quando antes terá sido aqui!



3 comentários:

Fernanda Turchetti disse...

Nossa Vanusa, me identifico demais com suas palavras... no fundo, no fundo o que mais temos somos nós mesmos com um pedacinho de cada um com quem convivemos. O lugar é um contexto; a família, os amigos, as pessoas são nossas raízes. Não sei se já assistiu... se não, assista "Na Natureza Selvagem" - a frase que mais me marcou foi: "The happiness is real when shared". Grande abraço saudosos para você, Rodrigo e Diego,
Fernanda Turchetti

Leonardo, Daniela, Júlia, Sophia e Caio disse...

Meu Deus, Vanusa...que lindo!
Muito emocionante e sinceras suas palavras....Adorei o post!
O bom é saber que onde quer que estejamos estaremos amparados por Ele, pelos nossos daqui e de acolá! rsrsrs
Abração
Dani

Unknown disse...

Muito bonito seu post..diz o que vc sente e o que muitos de nós imigrantes sentimos,um pouco mais,talvez menos..mas a essencia é a mesma.
Parabéns,vc escreve muito bem!